sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

FILOSOFIA SEM REGRAS HUMANAS

Estou sendo informado pela revisora de um livro que estará indo para o prelo dentro de dois a três meses, que não posso mais escrever Baía de Todos os Santos como sempre o fiz, porque a reforma ortográfica da língua portuguesa determina que de agora em diante só se escreva assim: Baía de Todos-os-Santos. São as novas regras. Mudam os homens (e mulheres) nas academias e assim, mudam-se as regras. Desde menino - tenho 73 anos - já perdi a conta das alterações feitas na ortografia. Não há cabeça que aguente isso e haja dicionário novo, para acompanhar tais reformas. Somos vítimas dos distúrbios psicológicos que fazem os seres humanos assim, tão volúveis, tão instáveis em suas atitudes e preferências.
Confunde-se evolução com revolução. A evolução é fruto da ação paciente da Natureza, em acordo com suas leis irrevogáveis, sob as quais se faz Justiça e se administra o Cosmos. A revolução é invenção dos homens vaidosos, que exibem-se com demonstração de poder, em desacordo com as suas próprias leis, que alteram ao sabor de suas conveniências, para criar o Direito, tentando organizar o Caos.
Essas regras humanas, todas mutáveis, buscam cercear a liberdade de criar e de fazer, engessando as artes plásticas e cênicas, a literatura escrita e oral, a organização política, a administração pública, enfim, tudo o que subordina o indivíduo e sua própria cultura aos interesses coletivos justamente dos menos evoluídos, dos autômatos, dos comandados por uma rainha, como nos formigueiros, cupinzeiros e colmeias, ou por um pastor muito consciente da lã e do leite que lhe darão suas ovelhas.
Em face a esse quadro, está um mundo desorganizado, caótico, onde predominam as regras artificiais em desacordo com as leis naturais. Quando a Natureza reage contra a voluptuosidade dos ignorantes envaidecidos que pensam ser poderosos, é "um Deus nos acuda" a jogar todos de cara para o chão em preces desesperadas, como se estas pudessem ser ouvidas. Fala-se em "fim do mundo" e confunde-se este com o apocalipse, que é só o seu anúncio, a previsão lógica dos que observam os cegos - aqueles que não querem ver - a caminhar para o abismo, isto é, as ovelhas conduzidas por um pastor ignorante e irresponsável.
Assim como os escritores têm medo de contrariar as regras ortográficas e escrevem em desacordo com a força da sua criatividade e com suas convicções intelectuais, essas ovelhas têm medo de sair da trilha traçada pelas regras econômicas que lhe alimentam, mas as esfolam periódicamente e conduzem ao matadouro.
Sair das regras artificiais sempre alteradas e seguir as leis naturais eternas, no entanto, não é apenas um ato de coragem, mas, sobretudo, de sabedoria. Sem esta, aquela é suicídio.
Os homens antigos eram todos pagãos. A palavra "pagão" vem do latim (pagus = aldeia no campo) e portanto, significa "aldeão" - aquele indivíduo que observava a Natureza e obedecia suas leis, considerando-as como deuses. Civilizações importantes foram erguidas, na Terra, dentro dessa filosofia, isto é, desta busca do conhecimento. Sempre que essas civilizações, no entanto, substituiram as leis eternas pelas suas próprias, criando o Direito dos Homens, contra aquelas, sucumbiram, delas se conhecendo apenas as ruínas.
Este é um processo que se repete agora, com um agravante. É muito maior a população dos aglomerados humanos. Será muito maior a agonia, o sofrimento, dos insensatos, dos que se aventuram por trilhas na escuridão, focados numa luz ao fundo, sem saber o que há entre eles e esta. Sem a busca do conhecimento, isto é, sem filosofia, toda trilha é muito perigosa. Sem "amor ao conhecimento", o homem não se esforça para obtê-lo. A vulgarização da Filosofia é mais importante e urgente do que a da própria Ciência, onde se quer chegar.
Neste momento de medo, de incertezas, portanto, a salvação da humanidade está na cultura do ego, no enriquecimento intelectual que aumenta a consciência em cada indivíduo. O descontrole das massas, como o estouro das boiadas, é o fim dos que avançam sem pensar.
Neste momento, meu pensamento manda-me desobedecer a essa regra artificial que manda colocar hífens em "Todos-os-Santos". Reagir contra o falso, é manter-se na verdade. É o primeiro passo para sair da boiada.
Adinoel Motta Maia

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